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10 de mai. de 2011

Trecho retirado do Livro dos Espíritos de Allan Kardec


"...Certas pessoas rejeitam a idéia da reencarnação pelo único motivo de que ela não lhes convém, dizendo ser-lhes suficiente uma só existência e que não gostariam de recomeçar outra parecida. Reconhecemos que o simples pensamento de reaparecer na Terra as faz pular de furor. É compreensível que o simples pensamento de terem de reaparecer na Terra as faça ficar furiosas. 

Mas a estes convém apenas lembrar se acaso Deus, para reger o universo, tenha que pedir-lhes conselho ou consultar seus gostos. Portanto, de duas coisas, uma: ou a reencarnação existe ou não existe. Se existe, embora as contrarie, será preciso enfrentá-la sem que Deus lhes peça permissão para isso. Essas pessoas parecem-se com um doente que diz: “Sofri o bastante por hoje, não quero mais sofrer amanhã”. Mas, apesar de seu mau humor, não terá, por isso, que sofrer menos amanhã e nos dias seguintes, até que esteja curado. Portanto, se tiverem de viver de novo, corporalmente, reviverão, reencarnarão. Protestarão inutilmente, como a criança que não quer ir à escola ou o condenado, para a prisão. 

Será preciso que passem por isso. Objeções semelhantes são muito ingênuas para merecer um exame mais sério. Diremos, entretanto, para tranqüilizá-las, que o que a Doutrina Espírita ensina sobre a reencarnação não é tão terrível quanto lhes parece; se a estudassem a fundo, não ficariam tão assustadas, saberiam que a condição dessa nova existência depende delas; serão felizes ou infelizes de acordo com o que tiverem feito aqui na Terra e podem, a partir dessa vida, se elevar tão alto que não temerão mais a queda no lodaçal."
...
"...Se não existe reencarnação, não há senão uma existência corporal; isso é evidente. Se nossa existência corporal atual é a única, a alma de cada homem é criada no momento do seu nascimento, a menos que se admita a anterioridade da alma e, nesse caso, se perguntará qual foi o estado da alma antes de seu nascimento e se esse estado não constituía, por si só, uma existência sob uma forma qualquer. Não há meio-termo possível: ou a alma existia ou não existia antes do corpo. Se existia, qual era sua situação? Ela tinha ou não consciência de si mesma? Se não tinha, é como se não existisse. Se tinha individualidade, era progressiva ou estacionária? Tanto num caso como no outro, em que grau se achava ao tomar o corpo? 
Ao admitir, de acordo com a crença popular, que a alma nasce com o corpo, ou, o que vem a dar no mesmo, que antes de sua encarnação tinha apenas qualidades negativas, fazemos as seguintes questões:
  1. Por que a alma mostra aptidões tão diversas e independentes das idéias adquiridas pela educação?
  2. De onde vem a aptidão extranormal de certas crianças de tenra idade para determinada arte ou ciência, enquanto outras permanecem inferiores ou medíocres por toda a vida?
  3. De onde vêm, em uns, as idéias inatas ou intuitivas que não existem em outros?
  4. De onde vêm, em algumas crianças, esses instintos precoces de vícios ou de virtudes, esses sentimentos inatos de dignidade ou de baixeza, que contrastam com o meio em que nasceram?
  5. Por que certos homens, independentemente da educação, são mais avançados que outros? Se tomardes uma criança hotentote1 recém-nascida e a educardes nas escolas mais renomadas, fareis dela algum dia um Laplace2 ou um Newton3?
Perguntamos: qual é a filosofia ou a teosofia4 que pode resolver esses problemas? Ou as almas são iguais no seu nascimento, ou são desiguais, não há a menor dúvida disso. Se são iguais, por que são tão diversas as suas aptidões? Dirão que isso depende do organismo. Nesse caso, então seria a mais monstruosa e mais imoral das doutrinas. 
 
O homem seria apenas uma máquina, o joguete da matéria, e assim não teria mais as responsabilidades por seus atos, pois poderia atribuir tudo às suas imperfeições físicas. Se são desiguais as almas, é porque Deus as criou assim; mas, então, por que essa superioridade inata concedida a alguns? Estará essa parcialidade, esse favorecimento de acordo com a Sua justiça e com o amor igual que dedica a todas as criaturas ?
Admitamos, ao contrário, uma sucessão de existências anteriores progressivas para cada alma e tudo estará claramente explicado. Os homens trazem ao nascer a intuição do que adquiriram em vidas anteriores; são mais ou menos avançados de acordo com o número de existências por que passaram, conforme estejam mais ou menos distantes do ponto de partida, exatamente como numa reunião de indivíduos de todas as idades, em que cada um terá um desenvolvimento proporcional ao número de anos que tiver vivido. 

As existências sucessivas serão, para a vida da alma, o que os anos são para a vida do corpo. Reuni de uma vez mil indivíduos, de um a oitenta anos. Imaginai que um véu seja lançado sobre todos os dias que ficaram para trás, e que, em vossa ignorância, os acreditais nascidos todos no mesmo dia: perguntareis naturalmente como uns podem ser grandes e outros pequenos, uns velhos e outros jovens, uns instruídos e outros ainda ignorantes.Mas se o véu que esconde o passado se dissipar, se chegardes a saber que todos viveram um tempo mais ou menos longo, tudo se explicará. "
 
"Deus, em Sua justiça, não podia ter criado almas mais perfeitas e outras menos perfeitas; mas, com a pluralidade das existências, a desigualdade, as diferenças e divergências da vida não tem nada contrário à mais rigorosa justiça: pois vemos apenas o presente, não o passado. Este raciocínio se baseia em algum sistema ou é uma suposição gratuita? Não. Partimos de um fato patente, incontestável: a desigualdade das qualidades, das aptidões e do desenvolvimento intelectual e moral, e verificamos que esse fato é inexplicável por todas as teorias correntes; enquanto a explicação é simples, natural e lógica por uma outra teoria. É racional preferir as que não explicam àquela que explica?
Em relação à sexta questão, sem dúvida se dirá que o hotentote é de uma raça inferior. Então perguntaremos se o hotentote é ou não é um homem. Se é um homem, por que Deus o fez, e à sua raça, deserdados de privilégios concedidos à raça caucásica5? Se não é um homem, por que procurar fazê-lo cristão? 
A Doutrina Espírita é mais ampla que tudo isso; para ela não há diversas espécies de homens, há apenas homens cujos Espíritos estão mais ou menos atrasados, todos, porém, suscetíveis de progredir. Não está, este princípio, mais de acordo com a justiça de Deus ?
Acabamos de avaliar as condições da alma quanto ao passado e ao presente.

Se nós a considerarmos numa projeção quanto ao seu futuro, encontraremos as mesmas dificuldades.
  1. Se nossa existência atual é única, deve decidir a nossa destinação vindoura. Qual é, então, na vida futura, a posição respectiva do selvagem e do homem civilizado? Estarão no mesmo plano ou estarão distanciados em relação à felicidade eterna?
  2. O homem que trabalhou durante toda a vida para se aperfeiçoar estará na mesma posição daquele que permaneceu inferior, não por sua culpa, mas porque não teve tempo nem oportunidade de se aperfeiçoar?
  3. O homem que praticou o mal, porque não pôde se esclarecer, será culpado por um estado de coisas que não dependeram dele?
  4. Trabalha-se para esclarecer os homens, para moralizá-los, civilizá-los; mas, para cada um que se esclareça, há milhões de outros que morrem a cada dia antes que a luz chegue até eles. Qual será o fim deles? Serão tratados como condenados? Se não forem, o que fizeram para merecer estar na mesma posição que os outros?
  5. Qual é o destino das crianças que morrem em tenra idade e que não puderam, por isso, fazer o bem nem o mal? Se ficarem entre os eleitos, por que esse favorecimento, sem terem feito nada para merecê-lo? Por qual privilégio se livraram das dificuldades da vida?

Há alguma doutrina capaz de esclarecer essas questões?
Admiti as existências consecutivas e tudo estará explicado de acordo com a justiça de Deus. O que não puder ser feito numa existência se fará em outra. É assim que ninguém escapa à lei do progresso. Cada um será recompensado de acordo com seu mérito real e ninguém é excluído da felicidade suprema, a que pode pretender, sejam quais forem os obstáculos que venha a encontrar no caminho.

Essas questões poderiam ser multiplicadas ao infinito, porque são inúmeros os problemas psicológicos e morais que só encontram solução na pluralidade das existências. Limitamo-nos apenas à observação dos mais comuns. Poderão também dizer que a doutrina da reencarnação não é admitida pela Igreja, porque ela seria a subversão da religião. Nosso objetivo não é tratar dessa questão neste momento; basta-nos ter demonstrado que a reencarnação é eminentemente moral e racional. Portanto, o que é moral e racional não pode ser contrário a uma religião que proclama ser Deus a bondade e a razão por excelência."
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"...Qualquer que seja, enfim, a opinião que se tenha da reencarnação, quer a aceitemos ou não, todos teremos de passar por ela, caso ela exista, apesar de toda crença contrária. O ponto essencial é que o ensina mento dos Espíritos é eminentemente cristão. Apóia-se na imortalidade da alma, nas penas e recompensas futuras, na justiça de Deus, no livre-arbítrio do homem, na moral do Cristo e, portanto, não é anti-religioso.

Até agora argumentamos, como dissemos, pondo de lado todo ensinamento espírita que, para algumas pessoas, não tem autoridade. Se nós, assim como muitos outros, adotamos a opinião da pluralidade das existências, não é apenas porque o ensinamento tenha vindo dos Espíritos. É porque esta Doutrina nos pareceu a mais lógica e porque só ela resolve questões até então insolúveis."
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"...Reconheçamos, em resumo, que a doutrina da pluralidade das existências é a única que explica o que, sem ela, é inexplicável. Que é eminentemente consoladora e está em harmonia com a mais rigorosa justiça e é, para o homem, a âncora de salvação que Deus lhe deu na Sua misericórdia."

  1. Hotentote: natural ou habitante da Hotentótia, África; raça negra, primitiva (N. E.).
  2. Laplace: Pierre Simon Laplace, astrônomo, físico e matemático francês, viveu de 1749 a 1827 (N.E.).
  3. Newton: Isaac Newton, cientista inglês. Viveu de 1642 a 1727 (N. E.).
  4. Teosofia: qualquer doutrina religiosa e filosófica que procura explicar e integrar Deus e o homem (N.E.).
  5. Raça caucásica: pertencente ou relativo ao Cáucaso. Habitantes do norte da Rússia, chamados russos brancos; a raça branca é também chamada raça caucásica (N. E.).


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